#70
Francisco Monteiro
O mundo está em constante maturação tecnológica, termo proposto por Muniz Sodré (2013, p.13), em que o autor defende não haver uma revolução e sim uma hibridização de recursos técnicos já existentes. Analogamente, poderíamos pensar que não será possível encontrar descobertas inovadoras no Marketing, o qual, a partir da década de 1930,
"tornar-se ia a ciência da administração da imagem da marca, ou o “negócio-total” (segundo Peter Drucker). Se o produto não vale tanto quanto a marca, a marca vale pelo o que ela significa. A partir dali, Marketing, Publicidade e Semiótica tornaram-se inseparáveis (...). Ou seja, as marcas significam, mas também nos significam" (Atem, 2009).
É através da publicidade que o Marketing cria um mundo de significações. Para Everardo Rocha, a publicidade “tem como projeto influenciar, aumentar o consumo, transformar hábitos, educar e informar, pretendendo ainda capaz de atingir a sociedade como um todo” (Rocha, 2010, p.30). A publicidade também retrata uma série de representações sociais, não apenas objetivando a venda produtos, mas fazendo com o que as pessoas consumam também estilos de vida, emoções, visões de mundo e outros.
Nesse sentido, nenhuma grande inovação poderia ser apontada na publicidade contemporânea do ponto de vista de seu projeto. Em 1960, ela já era a fonte de sobrevivência da maioria dos serviços de comunicação (Williams, 2011, p. 251). A publicidade é “quem paga a conta de uma produção que recebemos de graça ou fortemente subsidiada” (ROCHA, 2012, p. 42).
Contudo, sublinha-se que, se o Marketing e a publicidade não mudaram sua estrutura funcional e sua organização, eles participam ativamente dessa maturação tecnológica. O que Sodré considera como novo nesse processo de maturação é “o fenômeno da estocagem de grandes volumes de dados e a sua rápida transmissão, acelerando (...) a mobilidade ou a circulação das coisas no mundo” (Sodré, 2013, p. 13-14).
Através das novas linguagens de programação e do big data – termo genérico para designar grande volume de dados pouco estruturados que não cabem em um único servidor –, o Marketing é capaz de armazenar um volume gigantesco de informações, o qual é usado para aprimorar o seus conhecimentos sobre os consumidores.
Para Moraes (2009, p. 81), “na Internet o rastreamento dos consumidores vem se tornando moeda corrente”, que revelam os interesses do consumidor e seu comportamento diante dos anúncios. É assim que empresas de tecnologia como a Google Inc. ou de comércio eletrônico, como a Amazon, possuem dados suficientes para elaborar diversas ações de marketing e publicidade.
O objetivo desse trabalho é ser um ensaio introdutório para pensar o Marketing desenvolvido nas bases do big data e os impactos das novas técnicas de monitoramento do consumidor sobre a transferência e gerenciamento de significados, em McCracken (2003, 2012). O autor, em suas duas obras, sublinha a necessidade de se pensar a relação pessoa-objeto de forma dinâmica, em constante movimento.
Diante da facilidade em conhecer mais agilmente os hábitos online dos consumidores, o marketing no ciberespaço favorece, principalmente, as empresas que operam no varejo digital, mais especificamente, o chamado e-commerce ou comércio eletrônico em português. A pesquisa analisa a tecnologia e a cultura de métricas da Amazon, varejista no comércio eletrônico, para destacar a maturação tecnológica do Marketing e acrescentar, ao trabalho de Grant McCracken (2012), dados que ampliem sua previsão positiva acerca do comércio eletrônico.
A ideia de McCracken (2003) era de que os movimentos aconteciam em três localizações: da cultura para os bens e dos bens para o indivíduo. Em McCracken (2012), o autor parte do mix de marketing para fazer uma reflexão sobre a criação de valor e dar sugestões da maneira pelo qual o marketing poderia usar esse valor de modo mais sistêmico. O produto receberia transferência de significado vindo da cultura por meio tanto da publicidade, do design da loja, de catálogos, de websites, do Marketing; como por meio da televisão, de revistas, de jornais, da moda, das novelas, dos filmes, de tendências e outros.
Em 1997, o então fundador e CEO da Amazon, Jeff Bezos, definiu que a empresa teria uma cultura de métricas (Chaffey, 2009). A cultura de métricas também permitiu uma abordagem orientada de testes onde, por exemplo, em um lançamento de nova página no site, é possível dar tratamento diferenciado a determinados visitantes e medir uma série de parâmetros como unidades vendidas, tempo de sessão e outros.
No entanto, ao longo prazo, determinados testes podem sofre vieses com a evolução da experiência do usuário, que pode mudar sua forma de navegação e, portanto, a Amazon sabe que suas ferramentas devem ser constantemente desenvolvidas e atualizadas (Chaffey, 2009).
O que a Amazon vem desenvolvendo, por exemplo, em seu sistema de recomendações, é na verdade uma tentativa do que Douglas e Isherwood já haviam ditos anos atrás: “as pessoas usualmente compram o que veem que os amigos usam e desfrutam. Os contatos sociais não são aleatórios” (Douglas & Isherwood, 2013, p. 152). Para os autores, o homem precisa de bens para comunicar-se com os outros. Tanto a necessidade de consumo, como a de comunicação, são na verdade, uma só: o consumidor buscando informação sobre a cena cultural em constante mudança.
Todos os pontos do mix de Marketing, discutidos em McCracken (2012), sejam os que foram nesse trabalho destacados ou não, trazem desafios ao gerenciamento de significados. E em todos eles, o Marketing deve se esforçar para alcançar cada vez mais o que está “por trás dos dados” e também o que está “à frente” dos dados. Isto é, mais do que entender os padrões de consumo, é importante conhecer as categorias e princípios culturais que influenciam o fenômeno do consumo e, por sua vez, como o consumo influencia essas categorias e princípios culturais.
Assim, as métricas da Amazon contribuem para traçar mapas de relacionamentos de significados, mas embasados no comportamento do consumidor ligado em seu computador, smartphone ou tablet. No entanto, essas métricas ainda não alcançaram o patamar de responder exatamente como a transferência de significados ocorre.
Conclui-se que os avanços das análises dos grandes bancos de dados contribuem para a compreensão do fenômeno, mas reafirma-se que tanto um modelo informacional quanto significacional devem coexistir nos estudos do consumo.
Palavras-chave: big data, comércio eletrônico, consumo, marketing.